Thiago Barbosa
Tarde de domingo, 5ª rodada do Paulistão de 1997, Corinthians e Guarani, Pacaembu lotado e lá estava eu, na quilométrica fila de ingressos, aguardando ansioso a minha vez e com um certo receio de que os bilhetes se esgotassem antes de eu ter garantida a minha entrada.

Era a primeira vez que eu assistia a um jogo no estádio. E não é difícil imaginar o que representa para um garoto de 11 anos, fissurado pelo esporte bretão, ver de perto o jogo de seu time. A batucada dos torcedores na porta do estádio e a euforia das pessoas a comentar a atuação do Corinthians no último clássico faziam com que minha ansiedade de entrar naquele templo aumentasse ainda mais.

A fila diminuía gradativamente e meus olhos já alcançavam a bilheteria. Garantido o bilhete de acesso à arquibancada principal, rumei para o portão de entrada, quando quase fui atropelado por uma arrebatadora multidão de fiéis torcedores que corria em direção a um ônibus: era o 'Mosqueteiro', que transportava a delegação corintiana até o estádio.

Olhar fitado no ônibus, fransi as sobrancelhas para ter certeza do que estava vendo. Nem em meus melhores devaneios imaginei ver tão de perto os astros que tantas alegrias proporcionaram a este garoto apaixonato pelo Coringão. Um a um desciam os craques do time, interpelados por repórteres, em direção aos vestiários e ao coro de 'Salve o Corinthians, o campeão dos campeões...' declamado com entusiasmo pela torcida.

Faltava pouco para o jogo começar. Subi rapidamente a escadaria de acesso à arquibancada. Minha visão foi tomada por um inebriante tapete verde, palco do espetáculo que seria encenado naquela tarde. Os protagonistas ainda estavam no vestiário se aquecendo, repórteres de TV e rádio prediziam esquemas táticos e escalações e o trio de arbitragem checava os últimos detalhes antes de o jogo começar.

Cenário pronto. Os atletas entram em campo sob um ensurdecedor barulho de fogos, que se misturava aos gritos de 'Corinthians veio pra vencer, e os outros times se f...' proferidos pela nação corintiana.

Apito inicial. A bola começa a rolar e com ela um turbilhão de emoções aflorava em meu peito. O olhar ficou desnorteado, hesitando se fixava a atenção na partida ou na gigantesca bandeira dos Gaviões da Fiel que se estendia sobre a organizada.

Os minutos se passavam e eu era tomado por uma indisfarçavel avidez em ver um gol do timão. Virada do primeiro para o segundo tempo e só o que balançava a rede era o vento. Aos 36 minutos, quando a partida se descambava para um frustrante zero a zero, o atacante alvinegro Marcelinho Carioca recebeu lançamento e desabou na pequena área, provocando a agitação da torcida, que lançou uma série de impropérios ao árbitro. O mesmo, sem dar ouvidos às ofensas, apontou o dedo para a pequena área e assinalou o pênalti.

Quem presenciou a minha vibração poderia categóricamente afirmar que o gol já havia acontecido. Marcelinho, o pé-de-anjo, ajeitou com carinho a bola na marca da cal e tomou distância. Naquele instante não poderia olhar para lugar algum que não fosse a bola e o Marcelinho, que correu em direção a redondinha e, com um toque sutil de pé esquerdo, bateu no centro do gol, deslocando o goleiro, que pulou no canto direito. O autor do gol correu em nossa direção euforicamente a comemorar, subiu no alambrado e arremessou a camisa para o 'bando de loucos', que não cabia em si, êxtase.

A alegria de ter visto aquele gol foi maior do que a decepção de não ter conseguido pegar a camisa. Fim de jogo, placar apertado, vitória insossa, mas sem dúvida, o espetáculo mais emocionante que havia presenciado até então.